I. Aspectos gerais da negociação coletiva de trabalho e o papel do dirigente sindical.

 

Conforme dispõe a Constituição da República em seu art. 8, inc. VI, e a CLT no art. 611, § 2º, no Brasil, compete ao sindicato a atribuição da negociação coletiva de trabalho, sendo que na falta deste, quando a categoria for inorganizada, a federação e na falta desta a confederação. Portanto, a regra deixa clara a obrigatoriedade da participação da entidade sindical nas negociações coletivas, seja sindicato, federação ou confederação.

 

Como se sabe, negociação coletiva pressupõe um processo de diálogo, uma conversa de forma organizada entre a categoria profissional e categoria patronal visando à celebração de um instrumento normativo (Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho), para a solução do conflito coletivo entre as partes, o que pode ocorrer diretamente pelos próprios trabalhadores ou por uma comissão de negociação designada ou eleita, de acordo com a previsão do estatuto.

 

Este instrumento normativo, fruto das negociações coletivas, irá estabelecer as cláusulas econômicas e de condições de trabalho que integrarão os contratos individuais de trabalho durante a sua vigência, bem como as cláusulas obrigacionais que vinculam as partes convenentes. Ou seja, trata-se de norma com força de lei que deve ser observada pelas partes.

 

Todavia, a cada dia que passa tem se tornado mais difícil à categoria profissional obter conquistas nas negociações. A conjuntura política e econômica que assola o País, onde todos os “planos de governo” e “reformas” beneficiam o capital e arrocham os assalariados, tem sido os principais entraves.

 

O desemprego e o enfraquecimento da estrutura sindical impedem que se combata o clássico argumento patronal de que a “crise” não permite as empresas atenderem as reivindicações mínimas dos trabalhadores. A cada ano surge uma nova “crise”. A atual usada pela patronal é a “crise financeira mundial”.

 

E essa situação tem sido assim, desde que a organização sindical profissional começou a se enfraquecer frente ao poder econômico empresarial que se reestruturou a partir do final dos anos 80 deixando para traz a organização dos trabalhadores que fecharam os olhos para a realidade que se construía.

 

Com o advento da emenda constitucional 45/04, as negociações coletivas passaram a ser encaradas de uma nova forma. A responsabilidade pelo êxito ou fracasso passou a ser exclusivamente do dirigente sindical. A despeito de alguns entendimentos contrários a maioria da jurisprudência dos tribunais é no sentido de que para a propositura de dissídio coletivo é necessário que haja “comum acordo” entre patrão e empregado, caso contrário ele será extinto sem julgamento do mérito.

 

Considerando a crise por que passam as entidades sindicais, esta restrição trazida pela referida emenda constitucional seria extremamente prejudicial aos trabalhadores, tendo em vista a necessidade de aquiescência da patronal para o manejo do dissídio coletivo, o que poderia não acontecer já que o conflito estaria instalado.

 

 

Esta restrição aos dissídios e a conseqüente transferência do ônus da negociação aos dirigentes sindicais de certa forma trouxe uma maior dinâmica ao movimento sindical que se viu obrigado a valer-se com mais freqüência do direito constitucional de greve já que o uso do tribunal para solucionar o conflito estaria restringido.

 

É claro que o poder de usar a greve está restrito aos sindicatos maiores e organizados, os outros continuam à mercê dos patrões.

 

Não achamos que o poder normativo da Justiça do Trabalho deva ser simplesmente extinto. O ideal é que os trabalhadores estejam no mesmo patamar de igualdade com os patrões para negociar e estabelecer de forma justa as normas para reger as suas relações e aí sim, poderá ser extinto o poder normativo. No entanto, este tema demanda uma longa discussão ao qual não iremos entrar neste momento.

 

Em sua obra Dissídio Coletivo e a Emenda Constitucional 45/04, Ed. RTM, o eminente Desembargador e Professor Antônio Álvares da Silva, faz duras críticas ao movimento sindical de uma forma geral ao manifestar que:

 

“Os sindicatos brasileiros, tanto de empregados como de empregadores, se acostumaram a viver à custa do Estado. Pensam neles próprios e não naqueles que representam. Existem milhares, vivendo do monopólio da representação e da contribuição sindical. Estão ainda no limiar da modernidade. Não chegaram ao século vinte e um.”

 

Por outro lado, existem muitos sindicatos atuantes e que são barrados não pela inércia referida pelo eminente professor, mas, pela atuação do Estado no sentido de reprimir as lutas sindicais. Valendo dizer que na maioria das vezes a repressão se inicia pelo próprio poder judiciário que através de uma ordem judicial determina que os trabalhadores simplesmente não façam greve. É que em determinada situação ou atividade ao estabelecer percentual “mínimo” de trabalhadores em atividade por ocasião da greve é inviabilizá-la.

 

Mas a restrição trazida pela emenda constitucional 45/04, tem o seu outro lado que deve ser explorado. Talvez o caminho seja seguir a receita dada pelo Professor Antônio Álvares, na obra já referida, onde lecionou que:

 

“...quando se trata de conflito coletivo, para criar a norma a restrição do acordo é plenamente justificável, porque as partes continuam com o direito à negociação coletiva, a arbitragem e à greve. Têm, portanto, instrumentos muito maiores e mais eficientes para resolver o conflito. Não houve restrição, mas sim ampliação.”

 

“Se o empregador não anuir ao acordo para a proposição do dissídio coletivo, isto não significa que a negociação coletiva e o acordo coletivo ficaram extintos.

“Continuarão a existindo da mesma forma e o sindicato da categoria profissional poderá recorrer à greve para forçá-la.”

 

Completa o eminente professor dizendo que “o legislador constitucional pensou na liberdade sindical – art. 8º, no direito à negociação coletiva – art. 7º, XXVI e no direito de greve, art. 9º. Só depois é que previu a intervenção do Estado no art. 114, parágrafo 2º ...”

 

Então, o caminho é preparar o dirigente sindical possa assumir o papel que lhe foi outorgado pelos trabalhadores e que está garantido pela nossa Constituição Federal, que é o de fazer greve. Evidente que não podemos perder de vista que do outro lado do campo estão juntos os patrões e a repressão estatal.

 

Neste contexto, para se ter alguma conquista na negociação ou até mesmo para não perder conquistas anteriores, os dirigentes sindicais deverão estar mobilizados e investir pesado na organização nos locais de trabalho e por ocasião das negociações coletivas.

 

Entretanto, esta organização deverá acontecer não apenas por ocasião da data-base e na esfera apenas da estrutura sindical. Ela deve acontecer de forma constante e levando-se em conta as reivindicações específicas da categoria, o fortalecimento das entidades sindicais e, principalmente a perspectiva de uma transformação na sociedade, buscando instalar uma nova e verdadeira democracia que venha a primar pela dignidade da pessoa humana.

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